A Fuga



Na madrugada em que escrevera a fatídica carta, antes dos primeiros raios de sol, a princesa mandara um dos soldados levar um baú com suas roupas e sua égua para a cabana que iria morar, decidiu que sua ida para o novo lar deveria ser feito a pé, para que as coisas em sua cabeça se organizassem e a nova vida pudesse começar a acontecer, assim que o primeiro raio de sol abriu espaço entre as nuvens, Carmine desceu as escadas, o castelo inteiro ainda dormia, alguns guardas trocavam de turno.

- Bom dia Majestade, a capela já está aberta. 

- Obrigada cavalheiro - pequena reverência.

Era hábito da menina ir a capela caso acordasse muito cedo, ajoelhou-se e rezou, queria orientações. Onde estariam seus pais? Ela deveria sair mesmo do castelo? e a carta que agora repousava sobre o travesseiro, deveria ser lida? Um silêncio sepulcral invadia a capela e a alma, o Homem que pendia da cruz parecia conhecer aquela dor, a confusão do silêncio de Deus... levantou-se e já era a hora de partir, não teria coragem de se despedir depois que todo acordassem, ver todos aqueles olhos, na verdade ter que encarar aquele par de olhos. Saiu apressadamente, desceu as escadarias que davam para o portão, sem tempo para se despedir do jardim, já ia na metade do descampado que dava acesso a floresta como algo a fez olhar para trás. Viu que as folhas das bordas mais distantes da floresta balançavam estranhamente, algo muito grande parecia estar abrindo espaço entre as árvores, não demorou muito, os sinos ecoaram e a movimentação dos guardas era clara, um ataque estava por vir... paralisada foi assim que Carmine sentiu-se, os primeiros homens começaram a sair da floresta, a primeira torre foi atingida e um incêndio iniciou-se, diferente do que a lógica mandava naquele momento, a princesa começou a correr em direção ao castelo, um soldado inimigo mais atento notou de quem se tratava e correu em direção da princesa, espada desembainhada e furia nos olhos, nem aqueles olhos aplacaram Carmine, um grito a fez diminuir a velocidade a menos de 5 metros do soldado uma flecha o atingiu, espirrando sangue na realeza. Em segundos ouviu Sir. Petrus gritar seu nome e cavalgou em sua direção, enquanto se segurava com uma das mão a outra içou a flor da colina para a garupa do cavalo e continuou a corrida até as bordas da floresta, onde desceu a princesa, não tão gentilmente como faria normalmente. Outro estrondo ao longe e a torre onde seria o castelo de Carmine ruiu, a expressão de dor no rosto daqueles dois já não se escondia. 

- Corra Carmine, você mais que ninguém conhece a trilha secreta do rei. Salve-se!

- Não, não posso ir, Luccaria está sendo atacada. 

- Perdoe-me, mas não podes fazer nada majestade. Estamos perdendo tempo. 

- Eu preciso lutar, por Luccaria, eu preciso voltar... - foi interrompida, por uma voz ríspida, como nunca Petrus havia falado com ela. 

- Carmine você não vê, enquanto estiveres em campo de batalha Louys não se importará com a própria vida para cumprir a promessa do rei. Sua presença significa condená-lo. 

Diante dessas palavras a princesa apenas acenou com a cabeça, com um golpe rápido sentiu que Petrus arrancou seu relicário. 

- Guarde lembranças no coração majestade, não pode te reconhecer se te acharem... Vida longa a flor da colina. 

Disparou de volta a batalha, a essa altura o fogo já fazia parte da floresta e quase todo o castelo arder. 

- Vida longa a Luccaria... Foram as ultimas palavras da princesa antes de disparar em direção a floresta, a estrada que apenas a família real e Sir Petrus conheciam, a trilha secreta do rei fora projetado pensando em uma possível fuga de Carmine e parece que o dia chegou... 

Engano

É um monstro grande e azulado
Tão alto e majestoso
Ás vezes um tanto assustado
Nobre, real, glorioso
Mas é lindo demais para ser isso
Monstro não há de ser
É um anjo, doce e mortiço
Morrendo e chamando a morrer
Porém, ele não tem asas
Não voa, não canta
Não toca harpa
Anjo também não é
O que ele lembra é a água
É o mar! – achei a resposta
Que límpido reina e dança
Que beija a areia morta
E nela faz mil tranças
Mas, não!
Ele não é dançarino
Só brilha solitário
Sem rumo
Sem destino
Num azul inimaginável
É o céu! – só pode ser
Que é leve livre e cor
Tão simples como o amanhecer
Tão rico como o amor
Mas céu também não é
Pois ainda é mais belo
Mais doce, até
Que qualquer nobre caramelo
E se aproxima...
Aproxima...
Cada vez mais azul
Aproxima...
Aproxima...
 Socorro!
Quem és tu?
Mas logo então o vejo
Em movimentos bruscos
Acabou-se o desespero!
Que sorte!
Que susto!
Porque eram só teus olhos, querido

Apenas teus olhos

Canção de aniversário....

Naquela manhã, todo o mundo estava estranhamente quieto, menos os pensamentos dela que dançavam em sua cabeça, fazendo fluídos de ansiedade correr pelo seu corpo e fazer a extremidade de seus dedos gelar, seu estômago revirava, seu coração parecia um cavalo disparado, sua respiração estava pesada, inquieta demais, decidiu não permanecer na cama. Após levantar-se foi lavar seu rosto; prendeu, meticulosamente, seus cabelos e por e parou observando-se no espelho. 

- Bom dia Carmine! - Foram suas primeiras palavras, naquele dia! 

Havia alguma coisa que deveria se lembrar, alguma coisa que outrora seria muito importante, alguma coisa que ainda é muito importante, mas talvez por defesa tenha se escondido por entre suas lembranças.

Frente ao espelho uma coisa lhe chamou atenção, seus olhos que antes pareciam luzeiros da noite, durante o decorrer daquele ano, haviam escurecido mais pareciam pedras de carvão. Andou pela casa, preparou e comeu seu desjejum e assim começou a pensar o que faria naquele dia, mas seus pensamentos estavam barulhentos, ela simplesmente não conseguia pensar, vestiu-se e pôs a tiara que seu pai e sua mãe fizeram para ela, folhas e flores formadas por pedras preciosas roxas, agora emitiam alguns ponto de luz em meio a mexas de seu cabelo. Saiu para seu Jardim, que era nada mais, nada menos que a floresta onde passara boa parte de seus dias procurando aventuras (leia-se encrencas) e para onde fugia, deixando todos dos palácios impovorosos a sua procura, um sorriso brotou na sua boca, ao lembrar-se desses belos dias, mas logo sumiu, pois ela vieram a tona cenas do dia que escrevera a fatídica carta, do dia que que a sua ultima visão do castelo e da colina foi embaçada pelas lágrimas. Sentou-se no balanço artesanal dependurado em uma das árvores na frente de sua casa e num rompante precisava ver aquele cenário novamente.

Essa sensação de que havia algo a se fazer próximo a vila, o Castelo parecia lhe chamar novamente, ela precisava voltar. O que ela teria esquecido? roupa de montaria postas, botas e luvas calçadas, de fato ela não parecia uma princesa vestida daquele jeito, sorriu ao perceber que sentia falta dos vestidos que sua mãe todos os dias lhe obrigara a vestir, não sabia bem se sentia falta dos vestidos ou de sua mãe...

Foi ao pequeno estábulo, selou Zanahad. A égua que ganhara aos 12 anos, a crina negra e brilhante, caia sobre a pelagem, tão negra e tão majestosa quanto a crina, mesmo no palácio a própria Carmine fazia questão de cuidar do animal, de modo que ela continuara muito bem tratada, mesmo com a mudança de ares.

Vestiu a capa, estava pronta, montou e saiu em disparada pela trilha da floresta a medida que se aproximava de Luccaria, sua velocidade diminuia, até que desceu de Zanahad, deixou-a perto do lago, para que descansasse e seguiu a pé, mas antes que atingisse as bordas da floresta ouviu passos, aquilo lembrou-lhe do dia que foi atacada na floresta, assustada escalou a árvore mais próxima e escondeu-se entre as folhagens. viu que alguém se aproximava, o rosto lhe pareceu conhecido, mesmo que que de longe e entre as árvores, um baque no coração quando o reconheceu. um pequeno desequilíbrio quase a leva ao chão, mas consegui segurar-se.

A quanto tempo não via aquele rosto? Sentou-se para não se desequilibrar novamente, sua cabeça parecia nublada agora, não sabia definir se aquilo que sentia nesse exato momento era saudade, mas algo parecia vazio, dua palavras saíram de sua boca, embora sem som algum:

- Meu Cavaleiro...

De repente, notas ecoaram de uma citra e ela lembrou, notas de uma canção de aniversário, era disso que não se lembrava mais cedo, essa era a data, aniversário de Sir Louys. Os metros que, verticalmente, os separavam agora, pareciam do tamanho do abismo que ela fantasiava ter aberto no seu coração, sim, ela queria lhe dar os parabéns, queria dizer o quanto ele ainda era especial, que elas nunca quis... mas não podia fazer isso... e as lágrimas tomaram conta dela e lembraram de todas as canções e dos diálogos da janela, das flores da colina que poderiam ter murchado... Da flor da colina que, que ainda era maltratada pelas circunstancias, tirou a adaga do cinto retirou uma parte da casa da árvore e talhou na madeira:
-Vida longa, ao cavaleiro mais fiel de Luccaria-
subiu um pouco mais, para ficar o mais oculta possível, e deixou o as felicitações cair exatamente no colo do cavaleiro, este levantou-se sobressaltado.
- Quem está aí? revele-se é uma ordem!
Olhou para cima, mas nada viu, Carmine percebeu um rosto mais severo que o que ela lembrava e viu que ele notou a casca de árvore em seus pés, pegou e leu. De onde ela via, ele parecia estar procurando o autor de tal presente, não encontrando guardou-o em sua bolsa e sumiu entre as árvores em direção a castelo.
Depois de esperar um pouco, Carmine sentiu-se segura para descer, lembrou de Zanahad na beira do lago, montou, e abraçou o pescoço do animal como queria ter abraçado o aniversariante. A égua, pareceu sentir o pesar no gesto de sua dona e marchou a passos lentos de volta para casa, de volta para a clareira...
Sabe-se Deus o que vai acontecer daqui para frente e talvez seja melhor assim.



Cento e dois poemas

Já escrevi cento e dois poemas
Mas creio que agora seja o fim
De que adianta escrever-te tanto
Se tu nada escreves para mim?

Se tu soubesses quantas palavras
A cada hora, em cada dia
Farias para mim uma serenata
Com um violão, qualquer melodia.

No meu silêncio, eu te imagino
Apenas papel e caneta na mão
Já é tão tarde! – pensas consigo
Mas deixe-me ser tua inspiração!

Vai, velozmente, que o tempo não para
Porque se parasse – Ah! – seria tão bom
Que eu te escreveria mais cento e duas cartas
     E as assinaria com o vermelho batom

Dá-me um poema! – é o que te peço
Prometo que entendo tua letra torta
Dá-me palavras! – nem que seja um só verso
Que a tua gramática também não me importa


 Porque não existe uma rosa sequer
Mais perfumada que uma poesia
E nem a mais cara joia que houver
Seria motivo de minha alegria

Mas vejo que tu não me conheces em nada
Achas que sou só letra e cor
Não ficarei no papel de coitada
Escrevendo, esperando, valsando com a dor

Não há mais contrato, resolvi o problema
E se tu não escreveres qualquer linha boba
Eis que farei meu centésimo terceiro poema
E esse não será mais teu – Que pena!

 Darei a outra pessoa. 

Gabriela Ellen

I Resposta a uma desconhecida


Pernambuco, 24 de julho de 2015.

Minha amada desconhecida,

Tenho recebido teus escritos, mas só hoje consegui reunir a coragem suficiente para escrever-te. Não aches que essa demora em retribuir tuas palavras se deva à covardia ou à indiferença, te peço que não penses assim! Pelo contrário, só hoje o que sinto conseguiu traduzir-se, mesmo que efemeramente, em palavras.

A cada vez que leio cada frase que me direcionas, sinto um sorriso abrir-se sobre meus lábios; meu coração alegra-se ao ouvir tua voz doce e melodiosa, ecoada em cada palavra, cada letra, cada entrelinha.

Bem, te digo que não foste a única a esperar e a pedir; nestes longos (nem tão longos assim, é verdade...) anos em que existo, sempre movia meus pensamentos ao Pai e pedia que me enviasse você, para ser a dona dos meus dias.
O tempo passava, minha pressa me acelerava: “acaso meu destino é partir sem ti?”, pensava. Mas, de alguma forma, sempre em meus momentos de maior saudade eu conseguia vislumbrar tuas formas, tua presença... a certeza de que, um dia, estaria em meus braços jamais se afastou de mim.

“Tu és aquela que, mesmo sem saber, foste muito esperada.
E, numa manhã ensolarada,
Meus olhos de menino encontraram a ti.
Assim, com a alma apaixonada, senti que meu peito estufava - quase desfaleci!


Hoje, tenho a certeza de que meu destino não é viver sozinho, senão ao teu lado. Cada momento de espera, cada angústia despertada pela tua ausência não sobrevive por muito tempo quando penso em você. És doce, tão doce...

Já te amo do jeito que és, e peço que não mudes! Certo estou de que, apesar de nossas pequenas diferenças, não medirei esforços para que nossos planos, no tempo certo, se tornem realidade.

“Meu bem,
És a pedra sob a qual minha vida se assenta.
Sem você, meus dias são tristes,
A noite é mais escura e sem estrelas.
O sol chora lágrimas de fogo em sua ausência,
A lua encapsula-se em sua dor.
E vivendo num mundo sem cor
Não há nada que brilhe, senão o meu amor.
Que, apesar de tudo, de sua ausência tão distante, ainda pulsa em mim, multicor.
E assim caminham meus dias em sua ausência
Até que os céus, num ato de clemência,
Concedem uma graça a este pobre mortal:
Ver, uma vez mais e mais uma vez,
O teu sorriso sem igual.
Meu corpo todo se alegra,
O coração acelera,
E só aumenta o meu desejo de te encontrar
Para que, munido de toda coragem que em mim há
Possa a ti te declarar essas simples palavras:
Minha vida, longe de ti, já não há!

Com todo amor que há em mim,

Futuro esposo.

Poema Preso




A maioria das doenças que as pessoas têm são poemas presos.

Abscessos, tumores, nódulos, pedras…
São palavras calcificadas, poemas sem vazão.
Mesmo cravos pretos, espinhas, cabelo encravado, prisão de ventre…
Poderiam um dia ter sido poema, mas não…
Pessoas adoecem da razão, de gostar de palavra presa.
Palavra boa é palavra líquida, escorrendo em estado de lágrima.
Lágrima é dor derretida, dor endurecida é tumor.
Lágrima é raiva derretida, raiva endurecida é tumor.
Lágrima é alegria derretida, alegria endurecida é tumor.
Lágrima é pessoa derretida, pessoa endurecida é tumor.
Tempo endurecido é tumor, tempo derretido é poema.
E você pode arrancar os poemas endurecidos do seu corpo
Com buchas vegetais, óleos medicinais, com a ponta dos dedos, com as unhas.
Você pode arrancar poema com alicate de cutícula, com pente, com uma agulha.
Você pode arrancar poema com pomada de basilicão, com massagem, hidratação.
Mas não use bisturi quase nunca,
Em caso de poemas difíceis use a dança.
A dança é uma forma de amolecer os poemas endurecidos do corpo.
Uma forma de soltá-los das dobras, dos dedos dos pés, das unhas.
São os poemas-corte, os poemas-peito, os poemas-olhos,
Os poemas-sexo, os poemas-cílio…
Atualmente, ando gostando dos pensamentos-chão.
Pensamento-chão é grama e nasce do pé,
É poema de pé no chão,
É poema de gente normal, de gente simples,
Gente de Espírito Santo.
Eu venho de Espírito Santo.
Eu sou do Espírito Santo, eu trago a Vitória do Espírito Santo.
Santo é um espírito capaz de operar o milagre sobre si mesmo.

Viviane Mosè

Bobo palhaço



Maquiou suas lágrimas e desenhou nos lábios um sorriso.
Precisava chorar, mas tinha que por obrigação fazer sorrir.
Mentiu tanto, que chegou ao ponto de acreditar ser verdade.
Desde então não sabe o que sente. Nem sabe que finge.
O sorriso do bobo palhaço aos poucos se desmanchou,
na verdade seu sorriso nunca existiu.

Ninguém notou a dor por trás do sorriso maquiado.
Foi preciso borrar a maquiagem e fugir sem destino.
Olhava fixo para o nada quando viu na lata de lixo um trono.
E assim ele se sentiu rei. (Bobo palhaço).
A insanidade tinha nele se instalado e observando os lados,
viu que por trás da loucura estava o caminho mais próximo para ser feliz.

Djair Junior.
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